ASSASSINOS POLICIAIS E CONSTITUCIONAIS  À SOLTA

A Polícia Nacional Partidocrata, em Angola, mata à luz do dia. Todos os dias, na lógica da lei do “império feudal ideológico” do século XXI, em que os cidadãos são coisificados. Mais uma mulher, considerada uma coisa, um lixo, um objecto, um nada, conheceu a ferocidade de uma bala fulminante, disparada por um assassino.

Por William Tonet

Um energúmeno, uniformizado com a farda da Polícia, no dia 09.12.22, na zona do Teixeira, bairro Kassequel.

O crime: Exibir coluna vertebral erecta, dignidade, honradez e humildade de vender, honestamente, na rua, para não engrossar, na rua e motéis, o numeroso exército da prostituição!

O assassino foi promovido! Faz parte da Polícia Nacional (do MPLA), que não “distribui rebuçados nem chocolates”, como ordena o actual ministro do Interior, Eugénio Laborinho, por inexistência de um órgão policial republicano.

A zungueira, Raquel Kalupe, jovem de 30 anos (1992-2022) ficou estatelada, no chão, com um tiro, disparado à queima-roupa, no olho e abandonada, sem prestação de auxílio. Coisificada!

Os filhos estão órfãos! Ficarão… com fome! Por muitos anos, a meninice, poderá ter, no horizonte, a rua, a mendicidade e a delinquência.

O Executivo, no pedestal da sua quilométrica insensibilidade, demite-se de emprestar solidariedade e responsabilidade.

É mais uma pobre. Joana Cafrique e Sílvio Dala, foram ontem, os inauguradores das balas policiais com sabor a “rebuçados e chocolates”. Estes (os pobres), para o regime, são considerados a escória da sociedade, quando o inverso é que é verdadeiro, pela falta de coragem da maioria… dar um basta na boçalidade governativa…

A linguagem do ministro do Interior é um incentivo ao uso de armas de guerra, de assassinatos e espancamento, aos cidadãos indefesos que reivindiquem legítimos direitos, numa clara violação ao n.º 2 do art.º 4.º (Exercício do poder político): “São ilegítimos e criminalmente puníveis a tomada e o exercício do poder político com base em meios violentos ou por outras formas não previstas nem conformes com a Constituição”.

A linguagem golpista deveria, no imediato, ter obtido a sanção demissionária e jurídica, da parte do TPE (Titular do Poder Executivo) e do TC (Tribunal Constitucional) estivessem estes órgãos em desacordo. O silêncio é demonstrativo da longa cortina de espúria cumplicidade.

O passivo das atrocidades do consulado do homem forte do interior é longo e engloba, também, um crime de genocídio: Kafunfu, 30 de Janeiro de 2021, na Lunda Norte. Foram mais de 180 assassinatos de manifestantes indefesos, que gritavam por melhores condições, numa zona mineira, rica em diamantes, mas com os cidadãos votados desde 1975 numa pobreza e miséria extremas.

Estes crimes são imprescritíveis e insusceptíveis de amnistia, segundo o art.º 61.º (Crimes hediondos) da Constituição, logo, os autores, materiais e morais, a qualquer momento, podem vir a ser responsabilizados, civil e criminalmente.

No caso da Raquel Kalupe, pese a individualidade da acção, o responsável é plural: agente policial; comandantes, provincial e nacional, governador de Luanda, ministro do Interior, Titular do Poder Executivo, todos no âmbito da responsabilidade penal das pessoas colectivas.

O Código Penal no art.º 9.º (Responsabilidade penal das pessoas colectivas) diz:

1- “As pessoas colectivas, com excepção do Estado e das organizações internacionais de direito público, são susceptíveis de responsabilidade criminal.”

2. As pessoas colectivas e equiparadas, ainda que irregularmente constituídas, são responsáveis pelas infracções cometidas em seu nome, por sua conta e no seu interesse, ou em seu benefício, a título individual ou no desempenho de funções, pelos seus órgãos, representantes, ou por pessoas que nela detenham uma posição de liderança”, conjugado com o art.º 75.º (Responsabilidade do Estado e de outras pessoas colectivas públicas) da CRA (Constituição):

“1- O Estado e outras pessoas colectivas públicas são solidárias e civilmente responsáveis por acções e omissões praticadas pelos seus órgãos, respectivos titulares, agentes e funcionários, no exercício das funções legislativas, jurisdicionais e administrativas, ou por causa delas, de que resulte violação dos direitos, liberdades e garantias ou prejuízo para o titular destes ou para terceiros.

2 – Os autores destas acções ou omissões são criminal e disciplinarmente responsáveis, nos termos da lei”.

Os cidadãos indignados, os advogados pela Defesa da Justiça e Democracia devem fazer um cordão legal, para solidarizar-se com a jovem Raquel Kalupe e perseguir o assassino, para que mais um crime não morra solteiro, alavancando a nova visão do Código Penal (CP), que prevê a responsabilidade criminal de entidades colectivas.

Art.º 148.º (Homicídio qualificado em razão dos meios): “É punido com pena de prisão de 20 a 25 anos o homicídio cometido com recurso aos seguintes meios: a) veneno ou outro meio insidioso; b) dissimulação ou outro meio que torne difícil ou impossível a defesa por parte da vítima; c) actos de crueldade ou tortura; d) por experiência médico-medicamentosa ou outros meios tecnológicos afins, sem o consentimento do paciente.

2- O homicídio é punido com a mesma pena quando o facto for praticado: a) duas ou mais pessoas; b) com grave abuso de autoridade, sendo o agente funcionário público”.

A política angolana navega em águas turvas, sem a nobreza da bússola ética e moral, que deveria calcinar a mente de quem, chegado ao mais alto pedestal, deveria servir a colectividade e não servir-se dos bens materiais desta.

O governador de Luanda, responsável moral por estas mortes e o Titular do Poder Executivo, não condenam o acto, demonstrando a insensibilidade que grassa pelos corredores do poder.

Infelizmente, desde 1975 (2022), por falta de higiene intelectual, a política-poder está circunscrita à vontade de um HOMEM e de um PARTIDO (MPLA). Não por mérito ou capacidade destes, mas por omissão e covardia dos poucos, da maioria, que destilam, (in)voluntariamente, medo. Este é cúmplice da barbárie que, selvaticamente, se multiplica a cada ano, contra os filhos dos pobres e discriminados, sempre que ousem gritar e sonhar por um amanhã diferente.

Ricardo de Melo, Cassule, Kamulingue, Hilbert Ganga, Joana Cafrique, Sílvio Dala, Inocêncio da Mata, são, aqui e agora, apenas uma pequena representação, da lista que já vai longa e, eles, algozes, não se cansam de disparar e matar contra corpos indefesos e inocentes.

MULTIPLICAÇÃO DOS TOLOS NO PODER

Os tolos têm uma capacidade estonteante de multiplicação, fundamentalmente quando visam alcançar o poder, aproveitando a boa fé e fragilidade dos politicamente correctos. A ética evocada por estes, não faz parte da biblioteca mental dos senhores do poder, infelizmente.

A jovem, Raquel Kalupe portentosa mulher, exibia beleza, quer na exposição da sua bancada fixa, como portando a banheira, na cabeça, com produtos.

Ela era, vezes sem conta, assediada por agentes de Fiscalização e policiais das redondezas e foi vítima, por se ter recusado a abrir as suas reluzentes pernas aos fiscais que a perseguiam, qual matilha, para que esta lhes pagasse, gasosa (tributo-ladrão) material ou carnal, parta não mais ser importunada.

Incapazes de a seduzir, para a reles prostituição, apelaram a reforço policial, localizada na zona, que se desloca para o local, onde esta se encontrava e, sem qualquer abordagem inicial, optam por arrastar a indefesa mulher, para a traseira da carrinha.

Ela resistiu! Honradamente. Gritava, denunciando, a injustiça e perseguição, por parte dos fiscais, que a queriam extorquir, sexualmente.

De nada valeu o clamor. Os últimos gritos, implorando, compreensão, caíram em ouvidos mocos, porque, diz-se à boca miúda, o chefe policial, “também, a queria (comer) levar para a cama”…

E à medida que a brava guerreira via esvair a sua resistência, em sentido oposto, a “matilha” se agigantava, diante de uma pobre e honesta mulher, que se negou a levantar os panos e arrear o colã que portava, como escudo íntimo, ante a tentativa de penetração de pénis sujos de fiscais e polícias.

Esta postura foi-lhe fatal!

Os energúmenos, sabendo que Deus ou a natureza deu ao homem duas cabeças, não pensaram com a de cima e o fatídico aconteceu, apagando uma vida inocente. Mais uma!

Ao longo de 47 anos, a cultura da instituição policial, com raras, raríssimas, excepções tem sido: mata primeiro e pergunta depois… A vítima…

E, se dúvidas houvesse basta ler o comunicado da corporação policial: (…) “O Comando Provincial de Luanda da Polícia Nacional, comunica que no dia 09 do mês e ano em curso, pelas 16h00, no Largo da Teixeira, Distrito Urbano da Maianga, quando efectivos dos serviços de fiscalização do referido Distrito Urbano se encontravam na contenção à venda desordenada naquela circunscrição, e face alguma resistência violenta por parte dos vendedores ambulantes solicitaram o auxílio da polícia devido às agressões de que eram vítimas (…).

A “vox populis” considera morar aqui a primeira mentira, porquanto os fiscais abordaram a vendedora ambulante, não no mercado (local de concentração), mas na rua Direita da Tourada ao Kassequel, onde a vítima, sentada, diante de uma residência, vendia os seus produtos.

E segue o comunicado: (…) “Durante a abordagem policial, uma cidadã sentiu-se mal, e quando era socorrida pelas forças policiais ali presentes, de forma inadvertida surgiu uma vaga de violência por parte dos populares” (…).

A ser verdade, estando Raquel no interior da carrinha, a saída mais rápida nunca seria para o meio da praça, mas pela Tourada, que estava desimpedida. Mais, não sendo a vítima, porque nunca apareceu nenhuma outra cidadã, na carrinha?

A terceira incongruência, não deixa os créditos em mão alheia: (…) Perante a situação de eminente grau de perigosidade à integridade física, os efectivos da polícia efectuaram alguns disparos de dispersão, dos quais um atingiu de forma acidental e mortal uma cidadã (…).

Como “de forma acidental e mortal”, se a mesma cidadã se encontrava no interior da carrinha, como se lê no parágrafo anterior?

Mais, como uma bala acidental, vai em direcção ao olho da vítima, estando esta sentada, no interior de uma viatura, sem, na saída, perfurar o banco e o vidro, mas uma parede?

No caso, vertente a polícia condena a vítima por ter morrido, com um simples tiro, no olho…, saído de outros tantos “disparos de dispersão”. É como se fosse a história da mitologia grega, na crise que envolveu Medusa, uma das mais belas sacerdotisas e Atena, a deusa da guerra justa, que tinha uma rivalidade histórica com Poseidon. Este para provocar Atena decide conquistar Medusa. Tendo disso conhecimento, a sacerdotisa é enfeitiçada, transformando-a numa criatura com cabelos de serpentes. No final, a assediada é punida, como se fosse culpada da violência sofrida. A banalização do acto é como inocentar o mal, tornando a mulher, Medusa, como criminosa.

Em Angola, a realidade não difere, pelo contrário, a vida humana é severamente banalizada por uma instituição policial carente de pulmão republicano e democrata.

No mais, é um rosário de desculpas próprias de uma corporação que não se regenera, pelo contrário, faz do assassinato, do genocídio, uma cultura.

É hora da indignação geral, pois, ela poderia ser minha filha, sua irmã, sobrinha, neta, afilhada, prima, nora, esposa.

O agente policial, pode ser julgado, também, ao abrigo da Lei 4/94 de 28 de Janeiro, artigo 28.º (Abuso no exercício do cargo):“O militar que, de forma reiterada ou por interesse pessoal exercer atribuições indevidas ou se exceder nas inerentes ao seu cargo, sempre que a sua conduta não constitua crime mais grave, será punido com a pena de prisão”.

O MPLA vai, paulatinamente, privatizando o Estado, com a implantação de esquadrões da morte e a venda da soberania económica, ao capital estrangeiro e ao FMI, visando ampliar a ESCRAVOCRACIA dos vários povos e micro-nações, que habitam o nosso belo e portentoso território.

Os pacatos cidadãos, por tentarem sobreviver, vendendo alguma coisa, nas ruas, ante a denegação de emprego, pelo Titular do Poder Executivo, tornam-se escravos e colonizados, muito por terem, ingenuamente, acreditando serem cidadãos independentes, com direito de gritar, bem alto, por liberdades, direitos humanos, soberania e democracia.

Raquel, que a tua alma repouse em paz. Estamos cientes de que a raiva, o ódio, não abonam a construção dos países, principalmente os jovens e subdesenvolvidos.

Te garantimos, tu, que morreste em nome da dignidade, combatendo os predadores sexuais e a nova colonização económica, que as nossas vozes, principalmente, aqui no Folha 8, não se calarão, até o dia do juízo final.

Acredita, todos juntos, proclamaremos, na esquina da nova aurora (já faltou mais), a Independência Imaterial dos povos que habitam o território, que os portugueses denominaram Angola.

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